RAIO X
Não é de hoje que no 6º ano de Ensino
Fundamental temos uma radiografia nítida de uma realidade que se vê sempre como
nova, no grupo de professores que iniciam com esses meninos e meninas a segunda
fase do Ensino Fundamental. Os alunos são outros, os desafios semelhantes e os
professores os mesmos, consequentemente a radiografia não poderia dar outro
diagnóstico senão este, o 6º ano é:
- “avoados”
- “negligentes”
- “apresentam muitas dificuldades, mas
não fazem as lições...”
- gostam apenas de “brincar”
- são muito “dependentes” ... é para
copiar à lápis ou caneta ......
- são “indisciplinados”, etc.
O que será que aconteceu, disseram que
eram alunos muito bons, estudavam, se respeitavam, faziam silêncio durante as
aulas, respeitavam os colegas e a professora. Ouve-se com frequência “não é
possível este menino (a) não é mais o mesmo”.
Realmente temos uma radiografia do 6º
ano que nos dá um diagnóstico e exige um fazer pedagógico sincronizado entre os
professores e destes para com os meninos e meninas do 6º ano. Isto sem falar da
força da família (mãe) sobre os filhos e tentativas de determinar nossa ação
pedagógica.
Toda radiografia quando bem-feita
possibilita um diagnóstico nos mínimos detalhes, consequentemente a intervenção
“medicamentosa” será eficiente e eficaz. Tudo dependerá do fazer pedagógico e
gerenciamento da sala de aula.
RAIO X do 6º ano: São alunos vindos de
uma série, cujo professor era uma única professora, com talvez alguns outros
professores de Ed. Física, Arte, Informática. Nesse quadro “pedagógico” a professora
mantinha a rotina, “pelo olhar, seu aluno já a conhecia”, assegurando assim um
maior controle sobre os alunos.
Seria a quantidade de professores no 6º
ano o fator patológico? Esta diversidade dá um paradigma para estes alunos que
não correspondem com o que cada professor deseja. Sentem se livres, soltos e
fazem de cada aula uma única aula, porém em cada uma dessas aulas a postura
pode ser única. No 6º ano a rotina é quebrada pela troca constante do
professor, em uma manhã ele pode ter até 7 professores, cada um com seu estilo
de dar aulas, com o conteúdo específico de sua disciplina; para este aluno do
6º ano, um professor não sabe o que aconteceu na aula do outro, o que faz com
que este menino e menina “use” sua esperteza e faça de todas as aulas o que
eles quiserem: pedem para ir tomar água, sentam-se em lugar que não o seu,
falam o tempo todo, iniciam uma atividade e na aula seguinte não querem parar
de realizá-las. Fazem aviões, bolas e outros de papel . . . jogam nos colegas,
no chão... Se levantam para jogar algo no lixo o tempo todo. Falam com as mãos,
por isso precisam tocar, bater, empurrar o colega. “Parece” que tem formigas ou
tachinhas na cadeira.
Há na compreensão do aluno do 6º ano uma
“desorganização” do professor, da aula, da sala e da escola. Isso é prato cheio
para que façam o que quiserem. Eles vivem a “liberdade” de não mais terem a professora
como mãe, nessa dinâmica vive-se uma crise, um distanciamento e anonimato. Esta
crise, distanciamento e anonimato é seu porto seguro, nessa dinâmica sente-se
protegido e faz como bem entende promovendo um “tsunami” no início do
Fundamental II.
Seria o professor o responsável por este
distanciamento e consequentemente por este diagnóstico comum em turmas de 6º
ano, que todo ano abalam nosso furor pedagógico? Há outros fatores
diagnosticados que precisam ser refletidos e evocam uma ação por parte do
colegiado dos educadores para que ocorra uma transição tranquila entre um
seguimento e outro.
Entre diferentes fatores podemos dizer
da “descontinuidade do Processo de Ensino”, todos devemos nos ocupar em
contribuir para que esta transição ocorra de forma mais natural possível, pois
sempre há descompasso entre a rotina e procedimentos com o 5º ano e com o 6º
ano e, isto provoca um retardamento na interação com esta nova realidade e
consequentemente um comprometimento do aprendizado. Surge uma outra fala
comprometedora desse processo: “chegam ao 6º ano sem nenhuma base de
aprendizado, ou com uma base deficiente”.
O que acontece? O professor investe em
sua disciplina e nas exigências para que cumpra seu plano e o menino e menina
corresponda ao que propõe. Não há um acompanhamento devido para que esta
transição ocorra, simplesmente cada professor dá sua aula e cobra respostas e,
o aluno que estude e faça o que é pedido.
As diferentes metodologias não contribuem com a compreensão dos
conteúdos; os critérios de avaliação, produção e execução das tarefas também
são múltiplos proporcionando uma sensação de confusão nos estudantes. Não que
os educadores sejam os únicos responsáveis por tamanha confusão numa turma de
6º ano, mas há aspectos que precisam de uma imediata providência, basta olhar a
lousa, as ideias, informações e registros misturados, uma lousa para
universitário com um monte de coisas escritas interligadas por setas, riscos,
círculos, misturadas com anotações da aula anterior etc.... encontramos lousas
com indicações de páginas e exercícios a serem feitos, porém de que matéria?
Nosso raciocínio “adulto” tem claro e obvio que é da matéria que eu estou
dando, porém ele, o estudante pode ainda não ter assimilado a sua voz à
disciplina que ministra, muito menos aos comandos que dá. Por isso pode estar
na sua aula, te ouvindo, mas não se deu conta do conteúdo que você está dando e
muitas vezes não consegue estudar este conteúdo em sintonia com o que você deu
na aula anterior, certamente na memória dele está a aula de Ed. Física, na aula
de matemática e ou na anterior à sua. Esta confusão é percebida com maior
clareza quando eles têm trabalho escolar para fazer e entregar. Os critérios e
procedimentos em cada disciplina seguem princípios únicos, mas são diferentes
na sua forma, na sua orientação e até na avaliação, passando inclusive pela visão
pedagógica pessoal do professor.
Ao recebermos no 6º ano os alunos do 5º
temos orquestrado mantras entoados por nós e pelos pais: “no 6º ano você vai
ter de ser mais responsável”, “vai ter de estudar mais”, “agora começa o estudo
sério”. Estas falas reforçam neles a ideia de que até então nada valeu e que
agora o que era organização, dedicação, responsabilidade é confusão, é
desorganização e isto, consequentemente é o que dizem que é sério, mas na
prática pela diversidade de professor, disciplina, metodologia, critérios de
avaliação e acordos estabelecidos é “liberdade”: faço o que quero!
Na verdade, é preciso que reconheçamos
que essa crise – desordem apresentada por um 6º ano é um processo de maturação
fortemente marcado pelo lúdico e num contexto de diversidade de aulas e
metodologias dos diferentes professores próprios do Fundamental II eles
extrapolam no reino de possibilidades.
Com tantas possibilidades se perdem na
responsabilidade e dão lugar à “indisciplina” e esta, por sua vez ganha
dimensões aparentemente incontroláveis sustentadas por mudanças psicológicas e
físicas. Os estudantes do 6º estão saindo do que Piaget chama de
operatório-concreto, ou seja, estão entrando num processo que exige maior
abstração e subjetividade.
As dimensões físicas, mudanças, marcam
fortemente este estudante. O interesse por atividades em grupo, pelo sexo
oposto, a preocupação com a aparência, o corte do “cordão umbilical” para
mostrar que “já pode”, que “já é” desencadeio um turbilhão de sentimentos e
atitudes que contribuem significativamente com a “indisciplina” potencializando
um 6º ano insuportável, onde não se consegue dar aula, onde não querem nada com
nada, onde não fazem as lições e “não param quietos”.
A família e a escola constroem nos
estudantes a expectativa de que no 6º ano deixarão de ser tratados como
“crianças” e terão mais autonomia e independência. Na família são mais
autônomos para os sabores do alimentar-se, para os horários de dormir, no
horário de brincar com os colegas, no uso de celulares e games; alguns vão só à
escola, arrumam a própria mochila para as aulas do dia seguinte, não são
cobrados pelos pais das lições, das avaliações e quando perguntados sobre estas
desconversam e se afastam dos pais, o que para estes é algo permitido uma vez
que seu filho “já cresceu”. Estes elementos dão uma falsa ideia de liberdade e
os meninos e meninas não se sentem mais “vigiados”, o que lhes dá o direito de
não mais assumir seus compromissos escolares na escola e em casa.
Este quadro mostra numa mesma realidade
de 6º ano a construção diferente de estudantes, aqueles que conseguem administrar
os conflitos nascidos e crescem e, aqueles que se rendem à “desordem”
organizada e demoram em alcançar a maturidade, estes na maioria das turmas
“livres” na mente e “escravos” nas cobranças dos professores fazem do 6º ano a
pior das salas.
Diante do RAIO X apresentado, encaminhamentos são
necessários. Seguem três sugestões:
1.
ÚNICA LINGUAGEM:
professores definirem um padrão de rotinas quanto as tarefas, lição de casa,
trabalhos, metodologia da aula, avaliações, regras e acordos além de clareza no
estabelecimento das consequências para a quebra das regras e acordos.
2.
COMPARTILHAR
PRÁTICAS DE ENSINO/METODOLOGIAS: na medida do possível uma troca de informações
sobre as práticas adotadas, os caminhos percorridos e vivências aplicadas. O
uso do lúdico e do concreto em doses e momentos certos para que façam a
transição para este novo segmento que é Fundamental II.
3.
No campo
estrutural da instituição cabe oportunizar aos alunos do 5º ano vivências e
interação com o 6º ano, de forma que construam uma expectativa positiva;
oriente e aproxime as educadoras do 5º ano das práticas e forma de ser no
Fundamental II diminuindo assim a distância nesse momento significativo de
mudanças.
Para fazer pensar e agir proponho um recorte de meu
TCC na graduação em Pedagogia:
“Educar
humanamente é deixar nascer caminhos que superem os limites impostos pelo
social, pelo econômico e pelo político de maneira que a arte de educar trilhe
um caminho constante de construção e desconstrução, assim como o humano é,
ideia que ecoa na literatura de Guimarães Rosa ao conceituar o humano: “Mire
veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão
sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando.
Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou. Isso que me
alegra, montão” (p.48. TCC graduação em pedagogia – CEUCLAR 2008).
Sugestão para leitura:
NOVAES, Maria Helena. Psicologia escolar. Rio de
Janeiro: Vozes, 1970. P. 163-178.
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